Dimária Silva e Meirelles
Rev. Econ. Polit. v.26 n.1 São Paulo ene./mar. 2006
A ausência de uma base material não impede que o serviço tenha valor, principalmente valor de uso. Na verdade, "um serviço nada mais é que o efeito útil de um valor de uso, seja da mercadoria, seja do trabalho" (Marx, 1867, vol I:159). No caso dos serviços de transporte, por exemplo, o valor de uso destes serviços é o "efeito útil" do processo de transporte, que se traduz na existência espacial modificada, pois o que se vende é a locomoção. Ou seja, a utilidade do serviço se manifesta no processo de realização de trabalho, sendo impossível a sua circulação e utilização tal como uma mercadoria.
Portanto, na visão de Marx, a tangibilidade da ação da força de trabalho em movimento no circuito produtivo não é prerrogativa para que o trabalho aplicado seja considerado produtivo, ou seja, um trabalho que agrega valor. Do ponto de vista produtivo, o importante é que se estabeleça uma relação capitalista de produção. Esta proposição é válida tanto para a produção de bens quanto a de serviços. Neste sentido, Marx avança significativamente em relação a Smith, porque todos os serviços cujo processo produtivo se dê em bases capitalistas de produção são considerados produtivos, independentemente do resultado deste processo ser tangível ou intangível.
Lamentavelmente, porém, mesmo considerando a possibilidade das atividades de serviço serem produtivas, Marx abandona esta perspectiva de análise, dedicando pouca ou quase nenhuma atenção aos serviços. Preocupado em explicar o mundo econômico de sua época, o "mundo das mercadorias", o autor orienta seu esforço teórico à compreensão da lógica de funcionamento da economia capitalista baseada essencialmente na produção industrial. Neste contexto, embora as atividades de serviço, desenvolvidas mediante relações capitalistas de produção sejam consideradas produtivas, na visão do autor elas só adquirem importância econômica quando associadas ao processo de valorização do capital industrial - súmula de todos os capitais na economia. Desse modo, os únicos serviços considerados relevantes do ponto de vista econômico são os serviços de comunicação, transporte e armazenamento de mercadorias. Apesar de não contribuírem diretamente na formação do valor, estes serviços evitam a deterioração do valor de uso e tornam o produto acessível para o consumo, proporcionando a realização da mais-valia obtida no processo de produção e, assim, completando o ciclo de valorização do capital. São "um processo de produção dentro do processo de circulação e para o processo de circulação", ou seja, não constituem custos de circulação isolados, como é o caso dos serviços de comercialização.